domingo, 19 de outubro de 2008

Coleccionadores de experiências

2002.

Naquela sala maquinava-se o plano.

Iniciava-se a aventura.

A equipa, ainda jovem, ansiava por transformar aquele sonho em realidade. Os acetatos iam-se seguindo, uns aos outros, e o plano esbarrava, com impacto, na parede. O plano consistia em valorizar as experiências daqueles que ignoravam o manancial de competências que detinham. O desafio era convencê-los!

E foi assim que tudo começou.

Noite e dia, incansáveis, os escultores burilavam os coleccionadores de experiências, que nem pigmaleões a tentarem cinzelar os adultos ideais.
Percorriam-se caminhos sinuosos. Vagueavam pelos recantos escuros e silenciosos de Portugal. Por vezes chegavam a ser mais “filhos da noite”, pois as suas obras de arte só podiam, por vezes, ser lavradas durante o período nocturno.
Impacientavam-se, muitas das vezes, naqueles longos cursos, com os monstruosos transportadores de roldanas que, contava-se pelas aldeias, muitas vezes se desprendiam, indo a rebolar vertiginosamente para os campos dos amantes da terra. Buscavam forças nos momentos em que caixas transbordantes vomitavam, em plena cidade de Espinho, dossiers repletos de vidas. Encolerizavam-se quando salas, que deveriam estar impecavelmente limpas, exibiam no chão empoeirado restos de alface pisada, vestígios da festa da noite anterior. Engasgavam-se quando, por diversas vezes, os almoços tinham que ser engolidos sofregamente no assento de um carro.
E depois ouviam. Era a sua grande capacidade: o dom de ouvir em silêncio, sem soltar qualquer vocábulo. Escutavam com prazer para depois trabalhar a obra. Histórias. Umas férteis e jubilosas, outras tristes e atribuladas. Ouviam ininterruptamente sem pensar na açorda de marisco que fumegava naquele jantar de convívio; ouviam sem pensar na torre periclitante de documentos a ver para o dia seguinte; ouviam até os olhos e os ouvidos doerem, prenhos de vidas que não eram deles; ouviam abdicando, por momentos, das suas próprias vidas.
Acima de tudo partilhavam caminhos e saberes.
Mas as obras de arte iam surgindo e depois, esculpidas, desapareciam. Algumas perdiam-se sem deixar rasto; outras voltavam, de sorrisos gratos e vigorosos, ávidos por começar novos trilhos de sapiência.
T.G.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Retrato de um momento

“O essencial é invisível aos olhos. Só se vê bem com o coração.”
in “O Principezinho”, de Saint-Exupéry

Ao longe o mar.
No ar, um breve odor marítimo pintalgava o cenário campestre.
As portas deixavam sair o ruído metálico e contínuo das máquinas em movimento. Por detrás de cada máquina uma mulher de fato azul celeste. Por vezes, cirandavam pelos corredores alguns homens envergando batas de um verde suave.
Na sala, rostos exprimindo vidas coloridas, rugas traçando diversas histórias de vida.
Dificuldade inicial: fixar 62 nomes próprios de uma só vez.
Os dias iam avançando, as semanas passavam e os sorrisos iam-se alastrando. “Criavam-se laços”. Os olhos bombardeavam, dúbios, com perguntas ansiosas. Depois, as dúvidas dissiparam-se e os rostos amigáveis divertiam-se “destravando” a língua, libertando medos e angústias, desnudando a alma.
Como “papalaguis” sabedores atravessavam a lagoa de canoa. Tropeçavam em dificuldades mas logo voavam que nem “Fernãos” sonhadores em busca de respostas e de soluções para as suas dúvidas. De pena na mão, imaginaram palavras afectuosas a Tony Carreira, a Soraia Chaves, a Tony Ramos e viajaram até ilhas longínquas, narrando peripécias aquando de uma tempestade nocturna. Deleitaram-se, ainda, com paisagens nacionais, dentro de um comboio e sentiram a grandiosidade da música.
Os rostos, ausentes agora do trilho quotidiano, pululam nas bouças, cirandam por entre os pampilhos. Saltitam por detrás de cada rosa vermelha, por detrás de cada flor.
Abelhas que somos, dançando de flor em flor, tentando adocicar a vida de cada um, pincelando trilhos. Procuramos, que nem arqueólogos da vida, desocultar riquezas encobertas.
Ao longe o mar, ao longe gestos de grande beleza interior, ao longe sorrisos sinceros, ao longe olhares de esperança pousados num horizonte diferente.
Inícios de Outono.
Reencontro.
O local habitual de trabalho transformara-se. Vozes calaram a música repetitiva das máquinas. Seguiu-se uma entrega de diplomas memorável. 60 diplomas a escorregarem das mãos de alguém que normalmente se esconde e vagueia dentro da caixinha que mudou o mundo.
Emoções serpenteavam nas faces marcadas pela sapiência de vida. Risos rasgavam rostos gratos e o calor derretia a ansiedade fria que inicialmente os toldara. Levaram o diploma, a recordação e a saudade.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

A todo o Fernão Capelo Gaivota...

“Vê mais longe a gaivota que voa mais alto”
in "Fernão Capelo Gaivota", de Richard Bach


Tal como as gaivotas, também nós voamos, nem que seja somente em pensamento. No entanto, é preciso que o nosso pensamento se torne realidade. Para isso, é necessária a iniciativa porque a apatia e a passividade nunca concretizaram os sonhos de ninguém! É preciso olvidar os preconceitos, aquelas ideiazinhas das vozes da inveja que procuram impedir os nossos sonhos e que nos culpabilizam por os continuarmos a ter, apesar do avançar inexorável do tempo e da idade! É urgente preencher as nossas vidas, pintá-las com outras cores e perceber que ao atingirmos um horizonte, ao conseguirmos os nossos objectivos, é necessário ir em busca de outros!
T.G.