2002.
Naquela sala maquinava-se o plano.
Iniciava-se a aventura.
A equipa, ainda jovem, ansiava por transformar aquele sonho em realidade. Os acetatos iam-se seguindo, uns aos outros, e o plano esbarrava, com impacto, na parede. O plano consistia em valorizar as experiências daqueles que ignoravam o manancial de competências que detinham. O desafio era convencê-los!
E foi assim que tudo começou.
Noite e dia, incansáveis, os escultores burilavam os coleccionadores de experiências, que nem pigmaleões a tentarem cinzelar os adultos ideais.
Percorriam-se caminhos sinuosos. Vagueavam pelos recantos escuros e silenciosos de Portugal. Por vezes chegavam a ser mais “filhos da noite”, pois as suas obras de arte só podiam, por vezes, ser lavradas durante o período nocturno.
Impacientavam-se, muitas das vezes, naqueles longos cursos, com os monstruosos transportadores de roldanas que, contava-se pelas aldeias, muitas vezes se desprendiam, indo a rebolar vertiginosamente para os campos dos amantes da terra. Buscavam forças nos momentos em que caixas transbordantes vomitavam, em plena cidade de Espinho, dossiers repletos de vidas. Encolerizavam-se quando salas, que deveriam estar impecavelmente limpas, exibiam no chão empoeirado restos de alface pisada, vestígios da festa da noite anterior. Engasgavam-se quando, por diversas vezes, os almoços tinham que ser engolidos sofregamente no assento de um carro.
E depois ouviam. Era a sua grande capacidade: o dom de ouvir em silêncio, sem soltar qualquer vocábulo. Escutavam com prazer para depois trabalhar a obra. Histórias. Umas férteis e jubilosas, outras tristes e atribuladas. Ouviam ininterruptamente sem pensar na açorda de marisco que fumegava naquele jantar de convívio; ouviam sem pensar na torre periclitante de documentos a ver para o dia seguinte; ouviam até os olhos e os ouvidos doerem, prenhos de vidas que não eram deles; ouviam abdicando, por momentos, das suas próprias vidas.
Acima de tudo partilhavam caminhos e saberes.
Mas as obras de arte iam surgindo e depois, esculpidas, desapareciam. Algumas perdiam-se sem deixar rasto; outras voltavam, de sorrisos gratos e vigorosos, ávidos por começar novos trilhos de sapiência.
T.G.